Resultados da estratégia econômica
fazem com que a chefe do Executivo tenha um início de ano ruim. Inflação
resistente, juros altos, contas públicas sob desconfiança, baixo nível de
crescimento e, agora, apagões, tornam a travessia à reeleição mais complicada
» VICTOR MARTINS
Começou difícil o ano que definirá a permanência da presidente Dilma
Rousseff no Palácio do Planalto e do PT no governo. No front econômico, não
faltam notícias ruins. O país tem colhido os desgostos de uma política
considerada equivocada por especialistas, que combina quatro anos seguidos de
baixo crescimento, inflação alta, juros pesados, dólar nas alturas, contas
públicas desajustadas e uma desconfiança que mina a vontade de investir do
empresariado e da população, de consumir. Pior: essa safra de maus resultados
pode chegar ao seu ápice em plena campanha eleitoral, às vésperas do pleito
de outubro, quando se espera um Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA)
anualizado acima do teto da meta, de 6,5%, e números frustrantes de Produto
Interno Bruto (PIB) — dados que serão usados pesadamente pela oposição.
Somado às tensões econômicas, o governo Dilma vive ameaçado pelo
fantasma do racionamento de energia, diante dos constantes apagões que
atormentam o país. O baixo nível das reservas das hidrelétricas obrigou o uso
de termelétricas, energia mais cara e poluente. Mesmo assim, não tem sido
suficiente para suprir toda a demanda dos brasileiros. Os cortes no
fornecimento em grandes regiões têm sido constantes e o temor do Palácio do
Planalto e do PT é de que a oposição consiga pregar na presidente o rótulo de
incompetente, sobretudo por ela ter sido ministra de Minas e Energia e muitas
vezes apontada como excelente técnica no assunto.
O receio maior é assemelhar a imagem dela à de Fernando Henrique
Cardoso (FHC) meses antes de deixar o governo, quando entre julho de 2001 e
setembro de 2002 (véspera das eleições) enfrentou uma grave crise de
fornecimento de energia, obrigando a população a adotar um pesado
racionamento.
Dúvidas
O uso de termelétricas impõe outros problemas ao governo. Como são uma fonte
de energia mais cara, as tarifas precisariam subir para os consumidores, o
que significa mais inflação em um momento em que ela já está próxima do
limite de tolerância. “A situação crítica dos reservatórios, que ocorre ao
mesmo tempo em que há uma forte demanda por energia elétrica, pode gerar um
choque de preços na área de energia”, argumenta Gesner Oliveira,
sócio-diretor da GO Associados.
Para evitar uma piora da carestia, o Tesouro Nacional deve desembolsar
pelo menos R$ 18 bilhões, o dobro do previsto no Orçamento da União, para
subsidiar as contas de luz e evitar o vexame da presidente, que, em cadeia de
rádio e tevê, prometeu luz 20%, em média, mais barata. A questão é que, para
os cofres públicos, o cobertor ficou curto. O espaço é pequeno para o aumento
de gastos. Diante da ameaça de rebaixamento do Brasil por agências de
classificação de risco, o governo precisa dar sinais inequívocos de
austeridade fiscal. E um superavit primário (economia para o pagamento de
juros) de 2% do PIB, como defendem os analistas, não comporta a elevação das
despesas para bancar a fatura energética de milhões de brasileiros. Nem mesmo
com muita maquiagem.
As condições fiscais do país, o uso de contabilidade criativa para
fechar o balanço de anos anteriores e o intervencionismo estatal, sobretudo
na área de energia, que reduziu a capacidade de investimentos das
concessionárias, abalaram a confiança de empresários, consumidores e do
mercado. O país, agora, está incluído no grupo dos cinco frágeis, formado por
Turquia, Índia, Indonésia e África do Sul. “O Brasil, infelizmente, não é
hoje um país auspicioso, o que se resume na maior dificuldade de recuperar a
confiança dos investidores e do mercado”, diz Alexandre Póvoa, economista-chefe
da Canepa Asset. “O benefício da dúvida, que há três ou quatro anos era
pró-Brasil, se perdeu. Agora, é contra. Quando há uma dúvida, ninguém mais
acredita que iremos pelo caminho correto”, critica.
Mesmo com todas as promessas da presidente Dilma e do ministro da
Fazenda, Guido Mantega, de que, desta vez, será feito um arrocho fiscal
consistente, quase ninguém acredita. O Orçamento, no limite, em função de uma
gastança desenfreada, deixa pouca margem para a formação de um superavit
primário consistente. “Em parte, o governo está colhendo o que plantou”,
observa Oliveira. O governo está mobilizado para, até o próximo dia 20,
apresentar a meta de superavit e explicar como ela será cumprida. A ordem da
presidente é despachar a desconfiança e mostrar que o país pode voltar a uma
rota sólida de crescimento.
“Infelizmente, não há sinais de que a economia possa alcançar um
avanço mais robusto neste ano”, afirma Alexandre Bassoli, economista-chefe da
Opportunity DTVM. “Fica evidente que o ritmo de expansão da economia segue
sujeito a forte constrangimentos pelo lado da oferta, o que nos sugere que
não há espaço para um desempenho melhor neste ano”, argumenta. Para ele, o
ano será ruim ainda para o agronegócio e para os investimentos, sobretudo por
efeito estatístico, já que, em 2013, apontaram bons desempenhos e ajudaram
que o PIB tivesse um resultado ainda
pior do que o que será divulgado em março pelo Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE).
Torcida por virada
Bassoli e outros especialistas avaliam que também a indústria pode apresentar
um fraco desempenho neste ano, ao menos no primeiro trimestre. As empresas
seguem com nível de estoques elevados e, para evitar mais encalhe, 1,3 mil
fábricas pararam as linhas de produção com férias coletivas em dezembro
último, número 20% maior que em 2012. Todo esse quadro tem impacto direto no
PIB e a estimativa é de que o ano termine com uma expansão de 1,5%, número
que pode ser revisado para baixo nos próximos meses. Caso esse dado se
confirme, Dilma entregará a pior média anual de crescimento em 20 anos.
Para André Perfeito, economista-chefe da Gradual Investimentos, todos
os problemas vieram ao mesmo tempo. “É nessa hora que o governo precisa ter
um plano agendado e comunicado”, alerta. Os nós que o governo tem de desatar
antes das eleições, no entanto, parecem fazer parte de uma lista interminável
de problemas. A disparada do dólar frente o real, que acumula alta de mais de
20% nos últimos 12 meses, está pressionando o custo de vida. Se a divisa
continuar a subir e chegar à casa dos R$ 2,60, como espera parte do mercado,
o Brasil pode ser obrigado a apertar ainda mais a política monetária — de
abril de 2013 para cá, os juros passaram de 7,25% ao ano para 10,5% e podem
cravar 11,75% nos próximos meses. Assim, Dilma entregará uma taxa maior do
que a que recebeu do antecessor, de 10,75%.
A situação da Petrobras, que vende combustível no mercado doméstico a
um preço menor que o de importação, também pode implodir de vez os planos do
governo de fazer um ajuste moderado na economia. A elevação do dólar
pressiona o caixa da companhia e torna necessária novas correções nos preços
da gasolina, o que alimentaria a inflação. O governo tem esperanças de que a
divisa norte-americana mais alta favoreça os exportadores, mas a expectativa
ainda não se confirmou. Em janeiro, a balança registrou deficit de US$ 4
bilhões, um recorde para o mês. Com esse cenário, alertam especialistas, a
campanha da presidente Dilma Rousseff à reeleição enfrentará percalços de
tirar o sono.
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