Desoneração
BENJAMIN STEINBRUCH
Para uma governante que inicia o mandato, a desoneração deveria ser uma espécie de ideia fixa .
A PRIMEIRA discussão nacional na área econômica levantada após a eleição de Dilma Rousseff foi preocupante, porque trouxe a ameaça da recriação da CPMF, tributo derrubado pelo Senado em 2007. A segunda, porém, foi tranquilizante, porque resgatou o debate da desoneração, uma das palavras-chave para o atual momento em que a crise global parece estar longe do fim. É redundante discorrer sobre o impulso positivo que a desoneração tributária traz para a economia. Esse impacto evidente pôde ser comprovado na prática, no ano passado, quando a atividade produtiva foi rapidamente recuperada depois que o governo adotou reduções de impostos para vários produtos de consumo durável, inclusive e principalmente carros e eletrodomésticos.
Naquele momento, a desoneração se justificava para ajudar o mercado interno. O mundo desenvolvido estava em recessão e a saída era tentar estimular o consumo de bens por aqui. A estratégia deu resultado.
Com reduções de IPI, o Brasil estimulou a produção industrial e encerrou o ano no zero a zero, sem crescimento, mas também sem recessão. O estímulo dado, porém, abriu espaço para a grande expansão do PIB que vivemos neste ano, prevista em 7,5%, com reflexos animadores na criação de empregos.
Agora, a desoneração precisa atender também à indústria que produz para o mercado externo. A desindustrialização e a "reprimarização" da pauta de exportações são fatos incontestáveis. Os manufaturados já não são mais a maior fatia das vendas externas -representaram, nos primeiros três trimestres deste ano, apenas 39,5%, enquanto os básicos responderam por 44,6%.
Há dez anos, a relação era de 58% e de 23%, respectivamente.
A indústria de transformação também viu sua balança comercial se deteriorar rapidamente e já está muito longe do superavit, que chegou a atingir US$ 32 bilhões em 2005. Nos três primeiros trimestres do ano, a indústria acumulou deficit de US$ 25,8 bilhões, valor que deverá superar US$ 35 bilhões no ano.
Tudo isso se dá, em grande parte, devido ao câmbio. Alguns aços chineses, por exemplo, chegam ao Brasil por quase metade do preço do nacional, numa competição cambial desleal que dá uma ideia de quão difícil é a vida do exportador brasileiro por conta do real forte. Se é impossível alterar a cotação do câmbio no curto prazo, a saída é reduzir custos internos e daí a importância da desoneração ampla, inclusive da folha de pagamento, como parece estar nos planos de Dilma Rousseff.
Guardadas as proporções, a Alemanha viveu um problema semelhante ao brasileiro. No passado recente, a indústria alemã se viu ameaçada por competidores do Leste Europeu e da Ásia, que tinham mão de obra muito mais barata.
Sem poder alterar o câmbio, já que o euro é moeda comum, os alemães fizeram acordos políticos com sindicatos para reduzir salários, que até então eram os mais altos da Europa. A estratégia funcionou e a Alemanha manteve sua indústria competitiva e superavitária, enquanto em outros países da União Europeia ocorreu o contrário.
No Brasil, é impossível usar a fórmula da Alemanha. Aqui não temos somente os salários elevados e sim tributos e encargos muito elevados.
A desoneração da folha, portanto, acompanhada de um cuidadoso trabalho para melhorar a qualidade do gasto público, para não comprometer o equilíbrio orçamentário, poderia ser extremamente útil.
Acho até que, para uma governante que inicia o mandato em meio a essa opressiva conjuntura internacional, a desoneração deveria ser uma espécie de ideia fixa. Porque essa é uma forma rápida de repor competitividade ao produto brasileiro, num momento em que pouca coisa se pode fazer de imediato para contornar o problema do câmbio.
Outra forma é a adequação da política de juros internos à realidade mundial, uma velha reivindicação que o setor produtivo também espera ver atendida durante a próxima administração. O Brasil foi exemplar na política de mitigação dos efeitos da crise global em sua primeira fase. Precisa fazer o mesmo agora, na segunda.
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BENJAMIN STEINBRUCH, 56, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho de administração da empresa e primeiro vice-presidente da Fiesp. Escreve às terças, a cada 15 dias, nesta coluna.
Fonte: FOLHA DE SÃO PAULO
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